Eu quero tudo.

"Fala, fala, fala. Estou muito cansado. Já não identifico nenhuma palavra no que diz. Apenas me deixo embalar pelo ritmo de sua voz, dentro dessa melodia monótona angustiada perplexa repetitiva. Quase três da manhã. Não temos aonde ir, nunca tivemos aonde ir. Um nojo, vezenquando me dá um asco
— nojo é culpa, nojo é moral
— você se sente sórdido, baby?
— eu tenho medo, não quero correr riscos
— mas agora só existe um jeito e esse jeito é correr o risco
— não é mais possível — vamos parar por aqui
— quero acordar cedo, fazer cooper no parque, parar de beber, parar de fumar, parar de sentir
— estou muito cansado.
— não faz assim, não diz assim
— é muito pouco
— não vai dar certo
— anormal, eu tenho medo
— medo é culpa, medo é moral
— não vê que é isso que eles querem que você sinta? medo, culpa, vergonha
— eu aceito, eu me contento com pouco.
— eu não aceito nada nem me contento com pouco
— eu quero muito, eu quero mais, eu quero tudo. Eu quero o risco, não digo. Nem que seja a morte."

(in Anotações sobre um amor urbano)

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